
A materialidade do trabalho artístico de Lourdes Castro apresenta uma subtileza diáfana, tanto no seu aspeto formal ou volumétrico como na sua expressão de criatividade e comunicação, num arco de soluções práticas que vai do objetualismo reciclado dos anos 60 à poetização e materialização estética da sombra, esse perfil cósmico com o qual a artista sempre se identificou. Seja na produção de objetos de diversa origem, cor e materialidade, ou em instalações ou assemblages de cariz intimista, as suas Sombras Recortadas, assim como as Sombras Projectadas (na vertical, sobre a parede ou sobre a tela), os orientalistas Teatros de Sombras ou as Sombra Deitadas (sobre lençóis), constituiriam as modalidades essenciais do seu amplo conceito de «Sombra», numa peculiar reinvenção criativa e artística, que definiu a sua imagem autoral desde os anos 60 e 70. Em lençóis bordados e expostos na horizontal sobre colchões, que ganham desse modo uma rara evanescência, em plexiglas, papel, plástico ou acrílico fluorescente recortados ou pintados, Lourdes Castro amplifica a dimensão bidimensional da ideia de quadro, conferindo-lhe uma nova espessura ou tridimensionalidade visual, aí se paradoxalizando o conflito artístico da época, entre a objetualização e a desmaterialização da arte, dessa forma abandonando a questão, antes primordial, da representação. Esta só interessa à artista na perspetiva de uma subtileza vital, como um espectro no limiar da passagem, o ínfimo registo na longa temporalidade. [David Santos]
Exposições coletivas
2024: JARRA HUMANA: Obras da Coleção de Arte Contemporânea do Estado, Museu de Arte Contemporânea de Elvas, Portugal
Bibliografia
Francisca Portugal, «HUMANO-COISA» in JARRA HUMANA: Obras da Coleção de Arte Contemporânea do Estado. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, outubro de 2024, cit. p. 10, rep. p. 16-17, 49.