Ministério da Cultura compra pintura de Paula Rego intitulada «O Impostor»

Publicado a 2 Janeiro 2023
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O Ministério da Cultura comprou a pintura de Paula Rego intitulada «O Impostor», uma obra da década de 60 (1964) que retrata o país no período da ditadura de Salazar.

A peça integrará a Coleção de Arte Contemporânea do Estado (CACE) e é a primeira aquisição para o novo MAC/CCB, que vai suceder ao antigo Museu Coleção Berardo.

Paula Rego, O Impostor, 1964

Atualmente a CACE integra oito obras da sua autoria, datadas das décadas de setenta e oitenta. Tendo em consideração o número de obras e os períodos de trabalho da artista representados na CACE, esta peça é representativa do período inicial da atividade da artista, que vai do final da década de 1950 a 1965, fase que corresponde ao desenvolvimento da sua identidade artística e plástica bem como temática.

Intitulada «O Impostor», esta pintura a óleo e técnica mista sobre tela, datada de 1964, corresponde a uma fase fundamental de produção e investigação da artista, caracterizada pelo desenvolvimento de formas de criação livres e espontâneas em que apresenta narrativas fragmentadas, povoadas por figuras, recortadas e recompostas. Nela, com recurso a diferentes técnicas, a colagem e o recorte, Paula Rego realiza composições dinâmicas entre a pintura e o desenho, construindo uma imagem de valores contrapostos, entre a figuração e a abstração.

Obra de excepcional qualidade plástica, destaca-se igualmente o fundo ético e político que a justifica. Direcionando preferencialmente as suas investigações artísticas para temas e reflexões de âmbito político e social, esta obra testemunha o pensamento crítico e a dimensão satírica que sempre acompanhou o trabalho de Paula Rego, possuindo um vitalismo contestatário que nesta fase tem por referência o exercício ditatorial e abusivo do poder de António Salazar. Na tela surge o registo de uma data, 1928, e nela a artista retrata satiricamente a figura ditatorial e todas as marcas representativas do peso da realidade opressiva, da monstruosidade, da agressividade e dos excessos autoritários e políticos associados à história do regime do Estado Novo.

Se esta obra exemplifica o teor crítico e irónico dos trabalhos que Paula Rego produziu sobre a realidade portuguesa durante a vida política de António de Oliveira Salazar, ela é também significativa por pertencer ao conjunto de obras exibidas na primeira exposição individual em Lisboa, na Sociedade Nacional de Belas Artes. Esta peça, a par de outras obras plasticamente muito ricas aí mostradas publicamente, como «Cães de Barcelona» (1965), evidencia bem a qualidade e expressividade plástica do trabalho de Paula Rego, e o grande alcance interventivo da sua obra para a afirmação de uma cidadania reconhecidamente interventiva, atuante, participativa e crítica na construção de uma sociedade democrática.